BA: Líder religiosa é torturada pela PM e exige atitude do Estado do Vermelho
Na Bahia, Polícia Militar é acusada de torturar líder religiosa e do movimento negro Bernardete Souza Ferreira, que coordena o Assentamento Dom Hélder Câmara, em área sob jurisdição do Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra). O assentamento continua ameaçado pelos policiais, entidades exigem resposta do governador Jacques Wagner e farão ato no próximo sábado (13) em Ilhéus (BA). O governador receberá uma comissão nesta quarta-feira (10).
Bernadete de Souza Ferreira
A líder religiosa do Candomblé, Bernardete Souza Ferreira, 42 anos, foi algemada, arrastada pelos cabelos e jogada por soldados da Polícia Militar da Bahia num formigueiro no dia 23 de outubro, por ter pedido explicações para a invasão dos policiais da área do Incra, onde vive em Ilhéus. Bernadete denunciou na quarta-feira passada (3) que os mesmos policiais que praticaram a violência contra ela continuam soltos e passaram a intimidar testemunhas.
Casada, com o também militante do Movimento Negro Unificado, Moacir Pinho de Jesus, mãe de duas filhas e avó de uma neta de 4 anos – Omidaré -, Bernadete disse que a comunidade de Banco do Pedro, onde vive juntamente com mais 26 famílias de Sem-Terra, num total de 90 pessoas, continua apreensiva e amedrontada.
A denúncia a jornais locais foi levada pela advogada Adalyce Gonçalves que, já agindo como advogada da líder religiosa, em conjunto com o advogado, Dojival Vieira, fez a mediação entre Bernadete e a redação de veículos noticiosos, que passaram a repercutir o caso.
Absolutamente indignado
A Secretária Luiza Barros, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppromi), diz que governador Jacques Wagner, do PT, ao tomar conhecimento do caso teria ficado “absolutamente indignado”.
O movimento negro da Bahia e outras organizações têm realizado pressão para que o governador Jacques Wagner tome uma posição diante da atrocidade. Além da audiência, as entidades querem o afastamento do secretário de Segurança, César Nunes, do comandante da Polícia Militar e de todos os envolvidos diretamente na tortura.
O governador receberá, nesta quarta-feira (10), Bernadete e uma comissão de entidades, da qual participa a União de Negros pela Igualdade (Unegro), por meio do sua representante Ubiraci Matilde de Jesus.
Liderança do movimento negro na Bahia, Olívia Santana explica que a Unegro se soma à grita geral por um basta à violência e à intolerância religiosa: “agora você imagina uma violência absurda dessas ter sido feita por agentes do Estado, por policiais em serviço!”, indigna-se Olívia.
Segurança Pública na pauta
Ubiraci explica que a pauta principal a ser debatida com o governador é Segurança Pública. “Queremos nacionalizar os atos, o debate, mas de forma institucional, porque a segurança pública tem que ser preparada para conviver com a diversidade”, argumenta.
Para a liderança da Unegro, a verbalização dos policiais confirma o crime de intolerância religiosa, além de ter ocorrido violência contra a mulher. Ela diz ainda que as torturas realizadas lembram os anos de chumbo do país: “a ausência de aplicação das políticas públicas à população obviamente tem interface com a intolerância religiosa… o que ocorreu parece com o que acontecia na década de 60, durante a Ditadura Militar, quando os terreiros não tinham liberdade para exercer sua prática religiosa”.
Ubiraci informa que o movimento negro da Bahia já se reuniu com o Comando da PM, com o Ministério Público estadual e com o Chefe da Secretaria de Segurança Pública – pois, segundo ela, havia também policiais civis envolvidos na tortura a Bernadete. Na quarta-feira ocorre a reunião com o governador Jacques Wagner, e o movimento já está em contato também com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e com o Ministério da Justiça, por meio do conselho de segurança pública local.
Hamilton Borges Walê, líder da campanha “Reaja ou Será morto”, que denuncia o assassinato contínuo de jovens negros na periferia de Salvador, disse que os protestos continuarão com o ato marcado para o dia 13 de novembro, em Ilhéus. “Queremos que esse ato tenha dimensão nacional”, afirmou.
Invasão ilegal
A sessão de violência e tortura sofrida pela líder religiosa – que é filha de Oxóssi, uma entidade do Candomblé – começou na tarde do dia 23 de outubro, um sábado, quando um destacamento da PM baiana invadiu o Assentamento D. Hélder Câmara, à procura de um homem que supostamente teria escondido drogas no local.
Na reportagem a jornal local, Bernadete contou que o Assentamento, localizado no distrito de Banco do Pedro, vivia um dia tranquilo quando, por volta das 14h30, ela e o marido, o agricultor e professor de filosofia Moacir Pinho de Jesus, assistiam televisão quando perceberam a presença de oito policiais, que chegaram fortemente armados, com um jovem algemado.
“Eles disseram que estavam numa investigação e que não poderiam dar explicações. A gente colocou para eles que o assentamento estava sob jurisdição do Incra e que, para entrar ali, tinha que ter ordem judicial”, acrescentou.
Os policiais continuaram sua incursão, invadiram a sede da Associação de Moradores, vasculhando tudo o que encontravam pela frente. Foi então que a líder religiosa foi mais incisiva. “É melhor vocês se retirarem. Isso aqui é uma área privada, um assentamento. Vocês podem entrar nas casas de quem não conhece as leis. Mas aqui nós não somos abestalhados”, afirmou.
Tortura
As consequências da tortura ainda estão nas pernas de Bernadete, que foi jogada em um formigueiro pelos policiais
Foi o bastante para que o PM que comandava a patrulha, identificado como Adjailson, lhe desse voz de prisão por desacato e começasse a sessão de torturas que – após o lançamento no formigueiro – terminou com ela jogada num camburão e depois numa cela masculina, de onde só saiu horas depois, por intervenção de lideranças do movimento negro.
Guedes, o soldado identificado por Jesus e outro aspirante de oficial, Adjailson – a arrastaram pelos cabelos até um formigueiro próximo para, segundo ironizavam “tirar o demônio do corpo”. “Os PMs riam e diziam que estavam tirando o demônio “em nome de Jesus. Essas pessoas não têm nenhuma condição de lidarem com seres humanos e vestem a farda do Estado”, acrescentou Bernadete.
A mãe de santo não lembra quanto tempo ficou na cela masculina no 7º COORPIN, de Ilhéus, para onde foi levada, porém, recorda um detalhe: “Teve um momento que o preso que estava na cela tentou se aproximar de mim e aí alguém [que ela diz não saber quem] não deixou. Imagino que fiquei de três a quatro horas presa na cela”, acrescentou.
Diversidade de intolerâncias
Os policiais zombaram de Bernadete por ela ser praticante do Candomblé, o que configura a intolerância religiosa da ação. Como a vítima era uma mulher negra, a ação foi recheada também de racismo e violência contra a mulher.
Segundo Bernadete, o conforto pela violência, cujas seqüelas ainda estão presentes no seu corpo pela picada das formigas, tem sido a mobilização desencadeada pelos movimentos de terreiros de Candomblé, entidades do movimento social e do movimento negro, indignadas com o caso.
Da redação, Luana Bonone, com informações da Afropress
Retirado de http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/campanha-contra-a-tortura.html acessado em 10/11/2010
Comentário:
É tão grande o número de erros da polícia nesta ação que eu desisti de tentar enumerá-las...
Lamento o ocorrido. Façamos nossa parte por um mundo mais digno.
SALAM